24/01/12

Antes de ti eu vivia para as sextas feiras. Arrastavam-se os dias, ditos úteis, como massa de pão a escorregar lentamente por uma colher de pau. Arrastavam-se como velhas a atravessar a estrada num dia de pressa. E depois os dois dias de fim semana corriam ao sabor de dois minutos. Pareciam água a ser sugada ralo abaixo, aspirada pela força centrífuga. Um martírio. Mas um martírio tão frequente que ganhou moldes de quotidiano e tornou-se rotina. A rotina torna o difícil em menos difícil, e ao fim de alguns meses tornou-se fácil: suster a respiração à segunda feira, e ir largando ar pouco a pouco, até quinta feira à noite, hora de fazer a mala, expeli-lo de uma só vez, para ter os pulmões livres sexta feira e enchê-los do puro ar da casa. Domingo ao fim da tarde começava o nó a formar-se na garganta, um nó que eu logo reprimia convencendo-me que era só um suster de ar até voltar a ser sexta feira.
Mas depois apareceste e trocaste as voltas ao relógio. Desapareceu o martírio dos cinco dias de semana. Ganhei um novo pesar: o da constante e inelutável divisão de quereres. Quero estar aqui, quero estar em casa, quero estar em casa quando estou aqui e aqui quando estou em casa. Se sempre que venho a casa me lembro porque me aperta a garganta sempre que é hora de deixá-la, é certo também que em casa faltas-me tu, e a tua falta lembra-me porque é que me custa tanto sair daqui.

1 comentário:

inês janeiro disse...

muito obrigada :) eu adoro os teus blogs, sempre acompanhei os teus "365 dias à janela". tens sempre fotografias e textos que me dizem muito. beijinhos x