06/02/13
08.01.2012
Não havia, para ela, lugar de maior encanto (de entre os poucos lugares que conhecia dos infinitos existentes no planeta terra) que a sala de cima da casa dos avós. Praticamente intocada ao longo do ano, era dominada por uma quietude permanente interrompida apenas pelas vassouradas da avó no primeiro sábado de cada mês, que pouco efeito tinham no combate à espessa e quieta camada de pó que repousava sobre tudo. E era assim que mais gostava dela. Assim, escura, fria e húmida, ausente de pessoas, como um lugar de outros tempos. Assim e não como no domingo de Natal, cheia de cheiro a doces e assados e gargalhadas de pessoas. E assim, quieta e escura, transportava-A para um passado que não vivera. E, enquanto deitada no sofá verde-musgo, olhava para o candeeiro do tecto que imitava flores em cacho, pensava: quero ser este passado que nunca tive mas que se inscreve em mim como memórias reais de outros tempos. Como se eu tivesse vivido toda a história recente do meu país, como se tivesse ficado inscrita no meu ADN, gravada em impulsos eléctricos cerebrais. Quero reencarnar essa parte morta de uma vida minha que não vivi. De uma vida minha que é dos meus avós. E ser o meu país todo ao mesmo tempo.
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